A vida é uma bênção, mas também uma incógnita e um oceano de adversidades, confrontada, no quotidiano com luta, batalha, guerra, tristeza, alegria, filhos, família e sonhos. A liberdade, como bem maior, tem na felicidade a melhor aliada, para um ser humano credibilizar a sua soberania. Sócrates (470-399 aC), o grande filósofo dizia: “A vida não examinada não vale a pena ser vivida”.
Por William Tonet
O Folha 8 ouviu, viu e sentiu o clamor, gemeres e sentires das suas gentes, vindas do interior do torrão identitário e, ao contrário dos que têm poder para alterar a situação, não ficou refastelado nas luxuosas poltronas de Luanda. Colocou o pé na estrada, percorrendo mais de 2.000 km2, para ver, in loco, olhos nos olhos, o que se denunciava.
É estarrecedor. Triste! Vergonhoso, ver o Sul de Angola, esta enorme porção do território pátrio, rico em mineiros, gado bovino, caprino, suíno, solos aráveis, com ravinas, não só na terra, como também – e isso é mais grave, no tecido humano.
Eu sou deste chão. As minhas secundinas estão aqui enterradas. Por isso, também por isso, lagrimo, quando vejo um dos meus definhar à fome, sede e morrer desprezado pelas autoridades que tinham (e têm) a obrigação de fazer mais e melhor, para as populações, principalmente, as mais vulneráveis. Quem vê a rudeza destas imagens, não imagina o quão triste é ver e sentir a realidade ao vivo, em pleno século XXI e, no ano 2021, Julho, Agosto. Deplorável. Os responsáveis são demónios. Eles não vivem para servir, mas para se servir. Para se servir de forma desumana e numa arrepiante orgia canibalesca.
Eu estou REVOLTADO! Tenho vergonha! Vergonha de ser representado por governantes insensíveis que gostam mais do dinheiro do que das pessoas, que roubam aos pobres para ar aos ricos, e que assassinam o respeito pelo seu igual.
OS MONSTROS NÃO GOVERNAM, MATAM OS POVOS
O estado deplorável destes campos: Kahama e Kuroca, que as imagens documentam, revolta qualquer cidadão de bem, colocando os governantes nos mais altos patamares da maldade.
O foco da lente não mente, pois as imagens retratam as crianças, velhos e adultos atirados à sua própria sorte, como se fossem cães. Pior do que se fossem cães. Sem uma tenda, casa de banho, máscaras de COVID-19, cozinha comunitária, posto médico, enfermeiro, médico e comida digna desse nome, a sobrevivência depende da resistência de cada um e de Deus, para os que Nele acreditam.
As crianças nascem com fome, crescem com fome e morrem com fome, aqui, neste acampamento da Kahama e no do Kuroca, onde milhares de cidadãos vivem momentos delicados, fruto de uma seca atroz, mas, fundamentalmente, pela política de assistência social que, no mínimo, é criminosa.
Durante os 30 dias, dar fuba amarela, muitas vezes podre, para fazer pirão, acompanhado de feijão fervido, sem óleo e qualquer tempero, é não só revoltante como – não tenhamos medo das palavras – criminoso.
Depois é ver o coração partido, quando o pirão colocado num balde de 25 kg de tinta ou massa consistente, cozinhado num tambor de combustível, para ser distribuído a um universo de 80 a 100 pessoas ter de ser “multiplicado”, com água, numa ginástica da tia da distribuição, para o agora matete chegar ao prato de todos. Mas depois, a engenharia impossível é não se ter o mesmo resultado no feijão, uma quantidade bem menor, também misturada em água, com os primeiros pratos a receber 15 bagos, depois 10, 5, 2, casca, líquido e o restante a contentar-se com o cheiro de feijão. Triste.
Os dirigentes deste país não pensam nos governados, pelo contrário, agem pior que os colonialistas fascistas portugueses, que seguramente, dariam máscaras e duas refeições ao dia.
Deixar um cidadão hipossuficiente, com debilidades físicas e mentais, ao sol, frio, fome é da mais pura e abjecta desumanidade, melhor, é CRIMINOSO.
O Executivo, no caso dos cidadãos confinados nestes campos de concentração, da Kahama e Kuroca, tem um comportamento monstruoso, danoso e doloso, ao denegar assistência condigna.
Crianças, velhos, mulheres e adultos morrem todos os dias, sem que o regime sinta a mínima comoção, em colocá-los aos milhares a (sobre)viver em condições deploráveis à base de fuba de milho e feijão é um acto criminoso, quando o país tem recursos para fazer melhor por estes vulneráveis irmãos.
Os cidadãos das zonas mais críticas das províncias da Huíla e Kunene, colocados nestes campos de “acolhimento”, vivem os horrores de qualquer campo de concentração, talhados, para uma morte premeditada e dolosa de quem tem a responsabilidade de fazer melhor, com humanismo. Infelizmente, este sentimento não chega a estes campos.
Quando de longe se ouve falar deste torrão, não se tem a dimensão de campos de acolhimento, se igualarem aos de concentração, nada distantes dos que a memória colectiva, de muitos de nós, têm dos campos hitlerianos, onde eram confinados os judeus, que aguardavam por um único julgamento, uma única sentença: a morte! Morte que, também por cá, também por aqui, está ao dobrar da esquina… da fome.
Aqui, na Kahama e Kuroca morre-se confinado aos limites de uma área, onde o normal é faltar tudo, até a dignidade da pessoa humana. É a maior falta de humanismo, sensibilidade e responsabilidade governativa, que se tem memória.
Eu vi, nós vimos e reportar esta realidade é como ter uma pedra no meio do cérebro e no coração.
É uma autêntica barbárie. Um crime contra a humanidade, passível de procedimento judicial, que felizmente, não prescreve.
Um dia os insensíveis do poder, que colocam os seus povos a viver na mais indigna condição humana, quando esbanjam milhões em orgias, pagarão, o preço desta insensibilidade, que dilacera a nossa cidadania.
A liberdade, será conquistada e derrotará, um dia, nos picos do pacifismo, o autoritarismo e a ditadura partidocrata, proclamando a INDEPENDÊNCIA IMATERIAL e instaurando uma verdadeira democracia participativa e cidadã.